Impactos da transformação da ANPD em autarquia especial

No dia 13 de junho de 2022 foi publicada a Medida Provisória nº 1.124 editada pelo Presidente da República, que transformou a Autoridade Nacional de Proteção de Dados – ANPD em autarquia de natureza especial.

O texto original da Lei nº 13.709/18 (Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD) trazia a configuração da ANPD como órgão integrante da Presidência da República. Tal previsão não foi vista com bons olhos pelos especialistas, pois limitava, e muito, a autonomia da principal autoridade brasileira de proteção de dados.

À vista disso, a decisão tomada através da Medida Provisória nº 1.124/22 foi muito bem recebida pelo corpo de juristas e demais operadores da LGPD, pois trouxe alívio a um antigo pleito da comunidade especialista.

Além do mais, trouxe à tona o questionamento a respeito da constitucionalidade da criação de uma nova autarquia mediante Medida Provisória.

Neste ponto, vale dizer que o Supremo Tribunal Federal já foi questionado em outra oportunidade quanto à possibilidade da criação de autarquia mediante MP.

Na ocasião, no julgamento da ADI 4029 em que se interpelava a criação do Instituto Chico Mendes – ICMBio, a Suprema Corte entendeu pela possibilidade de criação de nova autarquia mediante Medida Provisória, desde que estivessem presentes os requisitos da relevância e urgência.

No caso da ANPD, foram justificados os requisitos da relevância e urgência para a edição da MP em razão da necessidade de adoção de medidas de fortalecimento institucional, tendo em vista a criticidade do tema e o posicionamento do Brasil no cenário econômico mundial.

Assim, em tese, não nos parece que a transformação da ANPD em autarquia de regime especial implicou em qualquer afronta ao texto constitucional.

Além disso, a princípio, impende dizer que a transformação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados traz fortalecimento à instituição, indo ao encontro dos ditames e princípios do direito fundamental à proteção de dados.

Esta autonomia se dá em razão justamente da própria concepção de Autarquia, visto ser pessoa jurídica de direito público, criada por lei de sua entidade federativa matriz, com objetivos administrativos pré-estabelecidos, dotada de autonomia institucional, administrativa e orçamentária/financeira.

Assim, toda autarquia tem autonomia administrativa, ou seja, ela mesma assina seus atos, contratos e determina como será sua organização interna e orçamentária.

Ademais, as autarquias, por serem pessoas jurídicas de direito público, podem receber delegações típicas do estado. Significa dizer que as autarquias podem exercer o chamado poder de polícia, que consiste na atividade estatal de intervenção no exercício das atividades individuais suscetíveis de periclitar interesses gerais.

Fora disso, as autarquias de regime especial são dotadas de maior autonomia e liberdade que as autarquias comuns, isso em razão de sua forma diferenciada de nomeação e escolha dos dirigentes.

Enquanto o cargo de dirigente de uma entidade autárquica comum é comissionado, de livre nomeação e livre exoneração, as autarquias de regime especial contam com estabilidade dos dirigentes, garantida por meio de mandato fixo, que só poderá ser perdido em hipóteses expressamente previstas. Ou seja, esse dirigente tem mais liberdade de atuação, podendo agir de acordo com as suas convicções e não para agradar o órgão supervisor.

Portanto, se de fato forem respeitados os pressupostos da autarquia em regime especial, sobretudo com a nomeação de dirigente técnico e com mandato fixo, livre das pressões do mercado e da política, certamente haverá um positivo impacto na temática de proteção de dados.

Sendo assim, a princípio, a transformação da ANPD em autarquia de regime especial trará bons frutos a esta tão importante autoridade brasileira, trazendo maior segurança e autonomia para a tomada de decisões e imposição de sanções aos agentes transgressores, algo tão esperado pelo corpo de juristas especialistas em proteção de dados.

 

REFERÊNCIAS

BRASIL, Medida Provisória nº 1.124, de 13 de junho de 2022. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2022/Mpv/mpv1124.htm>. Acesso em 20/06/22.

FILHO, José dos Santos C. Manual de Direito Administrativo. Barueri (SP): Grupo GEN, 2022.

PIETRO, Maria Sylvia Zanella D. Direito Administrativo. 34th ed. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2021.

 

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